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Porque dizemos #EleNão


Panorama eleitoral em números


Começaremos fazendo uma síntese das informações quantitativas das eleições dos últimos dias e, à continuação, procederemos à avaliação política dos dados e fatos. EleNão, atualmente com 28% das intenções de voto, lidera as pesquisas de intenções de voto praticamente desde o início da campanha, contudo apenas 53% dos que declararam que votariam nele estariam realmente decididos. O restante poderia optar pelo voto útil ou outras opções. O eleitorado de EleNão representa 36% dos votos masculinos e 20% dos votos femininos do total. Segundo a pesquisa Datafolha publicada quarta feira (19 de Setembro), 61 % de seus votos seriam masculinos. O 46% do seu eleitorado teria entre 25 e 44 anos, com um nível de escolaridade médio (48%), renda familiar de 2 a 5 salários mínimos e se localiza majoritariamente, na região sudeste (46%). No entanto, a rejeição pelo candidato é de 42%, a mais alta entre todos os presidenciáveis, dentro dos votos femininos a rejeição por EleNão chega a 54%.


Fernando Haddad, o candidato do PT, estaria em segundo lugar de acordo com a pesquisa de Ibope (do dia 24 de Setembro) com 22% das intensões de voto. Mais da metade dos votantes seriam mulheres (52%), a maioria entre 35 e 59 anos (49%). O nível de escolaridade seria maioritariamente ensino médio (46%), nível de renda dos votantes do PT seria de até dois salários mínimos (50%), localizados na região nordeste. A taxa de rejeição do PT aumentou a 30% e se localiza majoritariamente nos votantes com ensino superior (46%), faixa na qual EleNão também teria uma alta rejeição. Nos votantes com nível de renda de mais de cinco salários mínimos (50%) o PT registra a taxa de rejeição mais elevada de todos os candidatos.


Ciro Gomes (PDT), terceiro nas pesquisas, tecnicamente empatado com Geraldo Alkmin (PSDB), se mantém estável com 11% das intenções de voto. De acordo com a pesquisa de DataFolha de terça-feira (20/9), a maioria dos eleitores do candidato seria de mulheres (53%), de todas as faixas etárias, mas principalmente de 16 a 24 anos. Nível de escolaridade média (42%) e renda familiar de dois a cinco salários mínimos (80%), localizados majoritariamente nas regiões Sudeste e Nordeste. A taxa de rejeição de Ciro se localiza em torno de 18% e é maior entre os votantes com mais de cinco salários mínimos (25%), homens (20%), entre 45 e 54 anos (20%), com ensino superior completo (20%).


EleNão: como se apresenta, quem é seu eleitorado e qual é o seu projeto político


O candidato EleNão agrada à elite por defender a repressão de qualquer questionamento à ordem. Alguns setores da classe média concordam em sua defesa da meritocracia e se identificam com o seu posicionamento em relação à segurança pública. O empresariado, por sua vez, vê com bons olhos o programa de redução do Estado através de privatizações, bem como o fim das demarcações de terras indígenas e políticas ambientais, ao tempo que cresce a sua popularidade nas periferias. O candidato se apresenta como um patriota, antiglobalista, defensor de valores como família, religião, disciplina, autoridade e ética, e como um outsider do sistema político por romper com a lógica do politicamente correto, o que é lido pelos seus simpatizantes como um traço de autenticidade e honestidade [ii].


Perante o sentimento antipolítico, que corresponde à ideia de que política é sinônimo de corrupção, EleNão é visto como um candidato honrado que não compactua com as práticas da política convencional porque parece falar o que primeiro vem à cabeça. Seus ditos são justificados pela parcela mais humilde da população como exageros vindos de alguém que não tem papas na língua e que tem a “coragem” de fazer revelações “fracas” do que realmente pensa. Seus pronunciamentos emanam preconceito e ódio contra as “minorias” que, na verdade, são a maioria da população brasileira. Infelizmente, esses pronunciamentos refletem o pensamento de uma parte da elite brasileira racista, patriarcal e misógina.


Como coloca Mauro Iasi no seu texto “Um país fraturado”. Essa visão de mundo não pode ser resumida e simplificada num “discurso de ódio”, mas é a expressão de um ódio de classe manifestado por representantes de camadas privilegiadas. Sendo a expressão do receio desses segmentos de que as condições que permitem a manutenção de seus privilégios possam ser abaladas pelo despertar das massas. O ódio de classe se expressa também como racismo, LGBTfobia, machismo e misoginia ou outra forma qualquer de irracionalismo. Contudo, seu fundamento continua a ser o ódio de classe. Há uma clara diferença no tratamento da desigualdade e da violência contra negros, mulheres e LGBTs, quando se soma ao estigma do preconceito a condição de classe, ainda que seja sempre racismo, machismo, homofobia etc. É inegável que para os pobres e a classe trabalhadora, o preconceito assume a forma de risco de morte.

Contudo, não é apenas a elite que vota no EleNão e, este talvez seja o fato mais difícil de compreender. Para ajudar na reflexão, citaremos o educador popular Emilio Gennari, que no seu texto “O que o povo vê em Bolsonaro - Notas de uma reflexão necessária” tipifica a partir de Gramsci duas versões do candidato. As principais características dessa versão seriam honestidade, proximidade com o povo e o carisma; as mesmas que se adjudicavam a Lula nas eleições 2002 e 2006. No texto, o autor explica:


(...) o que vale é a sintonia que as palavras do candidato conseguem criar e a vontade que ele demonstra de realizar o que pretende. Convencido de que querer é poder, o senso comum não se preocupa com os elementos da realidade que negam o otimismo da vontade e nem com a possibilidade desta projetar oportunidades irreais, mas torce para que cada um tenha o que merece e mereça o que tem numa sociedade que valoriza o mérito individual. ( Gennari, 2018, pág. 3).


Seus eleitores se posicionam a favor da meritocracia e contra políticas de redistribuição de renda, mesmo pertencendo aos estratos sociais mais desfavorecidos, e inclusive tendo se beneficiado com programas sociais nos governos do PT. Segundo Gennari, isso se deveria à “nova condição social” que esses setores da população assumem em contraste aos mais pobres e que responde à necessidade de realização de novas aspirações:


A distância que estes grupos populares mantêm em relação às propostas do PT está relacionada à percepção da sua nova identidade social. Independentemente da renda e da ocupação, parte das entrevistas nas pesquisas citadas revela que as pessoas se autoclassificam como sendo de classe média pelo simples fato de terem acesso a moradia e alimento ou, numa variante parecida, se assumem como classe consumidora. (Gennari. 2018, pág. 6).


A ideia de que as coisas fugiram do seu controle e a sensação de impotência dominam o senso comum, segundo o educador. E quem está com medo e vivencia a violência diariamente não quer saber de causas, quer soluções imediatas. E aí é que EleNão entra se colocando como alguém capaz de resolver a insegurança de forma simples e efetiva, mediante endurecimento das penas, desregulamentação de posse de armas e anulação de direitos humanos. E o mais grave: apresenta o regime militar como solução para todos os problemas. Em entrevista ao jornal El País, em maio desde ano, nosso candidato à Presidência Guilherme Boulos explicou:


Nós vivemos em um período de muita insegurança da sociedade. Uma crise econômica, política, ética, uma falta de perspectiva de futuro. Esse sentimento geral de insegurança, incerteza, gera medo nas pessoas sobre o amanhã. A psicanálisenos mostra que frequentemente o medo se converte em agressividade, em intolerância. Quando somos guiados pelo medo, somos presas fáceis de um discurso agressivo. Nós mesmos reproduzimos esse discurso como uma formação reativa de nosso medo, uma forma de escondê-lo, de abafá-lo. É aí que o Bolsonaro entra. Ele entra como alguém que mexe nos piores sentimentos das pessoas, que canaliza pela via do medo, do ódio, a fragilidade que as pessoas estão em um momento como esse. Ele é uma síntese do que a sociedade brasileira tem de pior, dos sentimentos mais negativos das pessoas em um momento de crise.


EleNão é antidemocrático e sua principal estratégia é a despolitização e o apelo aos desejos mais podres da nossa sociedade. Sua estratégia consiste em colocar no centro do debate questões polêmicas de forma simplista como redução da maioridade penal, combate à homossexualidade e militarização das escolas evitando ou esvaziando debates econômicos, por exemplo. Isto, por um lado, reforça a ideia de que economia é um conhecimento técnico e não uma questão política e que apenas incumbe aos economistas. Certos debates como dívida pública, reforma tributária ou reforma da Previdência, que não são de fácil acesso e compreensão para a maioria da população são banalizados ou bem ignorados pelo candidato. Desta forma, EleNão reforça a ideia de que estas questões não são relevantes para a vida concreta e cotidiana das pessoas e, portanto, nem perde tempo explicando seu programa econômico.


O problema é que o projeto político por trás dessa personagem consiste numa truculenta articulação com setores militares e com agentes relevantes do capital financeiro. Hamilton Mourão[1], vice de EleNão ingressou no Exército em 1972, na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende, no Rio de Janeiro, também frequentada por Bolsonaro. Cumpriu missões militares em Angola e foi adido militar do Brasil na Venezuela. Comandou a 6ª Divisão de Exército e o Comando Militar do Sul. Atualmente organizou 70 candidatos militares para o Congresso com o objetivo de garantir uma bancada forte. Mourão, figura nefasta, dispara sem constrangimento, uma verborragia fascista, que vai desde a defesa da Intervenção militar a uma caracterização racista e misógina da Indolência e Malandragem do brasileiro; a primeira seria fruto dos indígenas e a segunda, oriunda dos africanos.


Paulo Guedes [2], Doutor em Economia pela Universidade de Chicago e sócio fundador do BTG-Pactual, um dos maiores bancos do Brasil, integra também a lista de fundadores do Instituto Millenium cujo papel dos integrantes é a formulação e sustentação teóricas das políticas neoliberais. A lista de doadores permanentes do instituto inclui o vice presidente das Organizações Globo - João Roberto Marinho. Guedes seria o futuro ministro da Economia, caso EleNão se eleja. Dentre as propostas que constam no programa do candidato, duas chamam a atenção. A primeira, zerar o déficit público em um ano e, a segunda, privatizar todas as empresas estatais. Se no infame projeto de corte de gastos públicos (PEC 241) se estimava que o déficit fosse zerado ao longo de doze anos, são incalculáveis os estragos que acarretam esses cortes em um ano.


A desestatização é promovida em prol da eficiência econômica e do equilíbrio das contas públicas, assim como do aumento da competitividade para as empresas. A proposta de Guedes consiste na utilização de recursos públicos (BNDES) para o financiamento da aquisição de empresas estatais por parte do setor privado, incluindo nesta empreitada, a privatização de dois grandes e lucrativos bancos públicos: a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil. Não entraremos aqui no debate sobre as privatizações das empresas estatais, para não perdermos a linha do argumento. Contudo, é preciso dizer que não existe motivo que justifique a privatização desses bancos (mesmo desde a ótica liberal) e a sua venda não geraria grandes economias para o Estado, já que o financiamento seria com fundos públicos. A privatização de empresas estatais sempre traz como resultado demissões, serviços de péssima qualidade a preços elevados, corte nos investimentos de pesquisa e desenvolvimento, entre outras consequências negativas.


Um fato curioso é que estas propostas de privatizações de empresas e bancos estatais não têm impactado nos preços das ações dos bancos privados (Itaú, Bradesco, Santander). Diferentemente, as ações do BTG-Pactual estão em franca subida desde julho deste ano e aumentam a cada novo ponto percentual de EleNão, o que segundo Galba poderia dever-se ao fato de que Guedes ficaria numa posição privilegiada para viabilizar as ditas privatizações. Ainda mais com fundos públicos.


Recentemente Guedes, assim como Mourão, constrangeram o candidato expondo a radicalidade de seu programa econômico. O primeiro propôs a criação de um imposto similar à Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o qual foi criado por Itamar Franco no governo de Fernando Henrique Cardoso. Já teve algumas tentativas de relançamento por diferentes governos com a justificativa de ser temporário até reequilibrar as contas públicas. O que implica que não seria tão temporário assim. Esse imposto recai sobre todas as movimentações financeiras em bancos ou instituições financeiras: saque, transferência e pagamento. O que significa que cada vez que retirarmos nosso salário ou pagarmos uma conta direto de nossa conta, estaremos pagando.

Outras medidas que o banqueiro pretende levar à frente são unificação da alíquota do imposto de renda em 20% para todos os contribuintes (pessoas físicas ou jurídicas) e a eliminação da contribuição patronal à Previdência. Esta reforma tributária regressiva claramente prejudicariam a maioria da população ao tempo que beneficia ainda mais, as camadas mais privilegiadas. Mas isto, infelizmente, não é tudo. Recentemente Mourão, o vice do candidato, criticou o décimo terceiro salário e o adicional de férias qualificando-os de “jabuticabas”. EleNão criticou as declarações afirmando não concordar com estas propostas o que é uma clara sinalização da precariedade de sua aliança.


Felizmente, as mulheres têm sido a vanguarda da resistência ao EleNão. A organização através das redes sociais de mulheres de diferentes idades, religiões, profissões e até ideologia política no grupo “Mulheres contra Bolsonaro” surpreendeu até às administradoras da página. A mesma chegou a reunir, em poucos dias, perto de dois milhões e meio de pessoas até sofrer um ataque cibernético por meio do qual excluíram e ameaçaram as administradoras e mudaram o nome para “Mulheres com Bolsonaro”, com a inclusão de vários perfis falsos que escreviam frases de apoio a EleNão. O grupo conseguiu se reorganizar, apesar de sofrer algumas perdas em função dos ataques e das ameaças, recebeu a declaração e apoio de parte de muitas pessoas famosas (desde Camila Pitanga, Daniela Mercury a Claudia Raia e Rachel Sheherazade) e logrou impulsionar uma série de manifestações em diferentes pontos do país contra o candidato. No Rio de Janeiro, a manifestação está marcada para dia 29 de Setembro às 15 h, na Cinelândia. Essa movimentação foi seguida por outros grupos (LGBTs, educadores, homens etc.) que começaram a se organizar sob a mesma consigna, para tentar evitar um triunfo do candidato EleNão. Isso demonstra a urgência na formação de uma frente antifascista para além dos objetivos eleitorais, porque a sociedade está polarizada e continuará após as eleições.


Nós mulheres dizemos EleNão porque ele é machista, homofóbico, misógino, racista e antidemocrático. EleNunca porque seu programa econômico neoliberal e suas obscenas alianças com o capital financeiro vão nos levar à miséria e à morte. EleJamais porque mais armas e mais violência não resolvem nosso problema de segurança pública, não queremos mais presídios e não queremos mais mortes de jovens negros. EleNunca representa tudo o que é contrário à vida, à igualdade e à liberdade. Dizer EleNão é mais do que ser contra um candidato a presidente, é ser contra uma saída histórica neofascista. E nós já nos pronunciamos.


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Sofía Escobar Samurio é militante do PSOL Niterói. Economista, graduada e mestre em Relações Interacionais. Colaboradora no Mandato da vereadora Talíria Petrone na Câmara Municipal de Niterói.


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